Apelo a Almeirim



Todos nós sentimos uma forte alegria íntima, ao revivermos os bons momentos do passado.
A terra onde nascemos, os lugares onde brincamos em criança, onde fomos felizes… transmitem-nos sempre, uma boa sensação de alegria e de saudade.
Esta boa sensação é-nos muitas vezes retirada, por aqueles que nunca a sentiram, nem a poderiam sentir.
Quantas vezes não acontece, voltarmos aos lugares da nossa infância ou juventude e verificamos com uma grande mágoa, toda uma alteração que alterou toda a beleza, daquele que era uma nossa importante referência afectiva.
Temos então de explicar a nossos filhos ou netos, que neste ou naquele lugar, havia um espaço e um enquadramento desaparecido, que era lindo, que era agradável, mas que já não existe.
Desse espaço a imaginação dos nossos filhos ou netos fará uma construção própria…mas já essa é muito diferente.
Depois deles já ninguém a recordará.
Talvez haja alguém que tenha a arte de registar em livro, fotografia ou filme, mas também tudo isso ficará numa prateleira de uma biblioteca pública ou numa gaveta de uma cómoda.
As mudanças serão cada vez mais rápidas e a memória afectiva, cada vez estará mais limitada.
As raízes então perdem-se…tanto fará viver na nossa terra, onde já não encontramos a referência afectiva, como em qualquer outro lugar.
Também já não vale a pena ir visitar a nossa terra, pois ela já está igual a todas as outras.
Este caminho é perigoso.
Retirar a memória colectiva, é destruir um direito de cada um de nós.
Retirar a memória colectiva é promover o desenraizamento colectivo, é dissolver a mais íntima das diferenciações humanas, que são as diferentes formas de amar e de recordar.
Por isso as sociedades modernas com respeito pelos valores humanos, só permitem a eliminação das referências colectivas, como uma excepção fundamentada no superior interesse colectivo.
Almeirim, também sofrido com este desrespeito para com este direito humano e por isso muito se descaracterizou.
Nada disto tem a ver com uma postura de resistência à modernidade.
Muito pelo contrário, pois ser moderno é ter a capacidade de criar melhores condições de vida para todos, sem pôr em causa os direitos de cada um.
Modernidade é a capacidade de criar condições de vida modernas, sem afectação dos sentimentos e da memória colectiva.
O estímulo do sentimento para com as nossas raízes, deveria ser um objectivo essencial da Administração Local. Não apenas pela salvaguarda do interesse dos que aqui nasceram ou viveram, mas também pelas oportunidades de desenvolvimento futuro que daí surgirão.
Realizar “obra” é muito importante, mas a “obra feita” também se distingue pela qualidade.
Essa maior ou menor qualidade, será a medida impulsionadora de muitas sinergias, de que dependerá o desenvolvimento futuro.
Sem paixão não é possível haver “obra de qualidade” e a paixão depende da memória da nossa infância e das vivências dos momentos de felicidade.
Sabem bem disto os povos que se impõem no mundo moderno.
Este processo de globalização actual, vem provar isso mesmo. São os povos com respeito pela “Sabedoria”, que se impõem a todos os outros.
A “Sabedoria” não é apenas conhecimento e ciência…é isso, mas associado à experiência e afectividade pelo passado.
Para se ter esta “Sabedoria”, é preciso viver num ambiente permanente de recordação e com os ouvidos muito abertos e atentos em relação à experiência dos anciãos.
O ambiente urbano, como uma permanente recordação do passado, é assim determinante para a formação das futuras gerações e para a qualidade de vida das populações.
Almeirim já foi muito penalizada, pelas circunstâncias históricas e também pela incúria, inconsciência e ignorância dos homens.
Como tenho o privilégio de ter tido a possibilidade, de ter a minha memória afectiva bem viva numa paixão pela minha terra….também senti esta necessidade, de fazer este apelo público.
O Projecto de criar um Centro Interpretativo da História de Almeirim, deveria assumir uma atenção particular de todos os seus habitantes e de todos os que têm responsabilidades na Administração Local.
Esse Projecto, é essencial para consolidar as raízes e para recuperar o orgulho próprio dos Almeirinenses.
O Edifício da antiga Junta Nacional do Vinho é simbólico da Cidade, um património local e terá de ter uma finalidade digna, que preserve toda a Identidade Histórica, que originou o que é hoje Almeirim.

Almeirim uma gloriosa História - Capitulo 31



Termino com este capítulo uma narração histórica, da Vila Real de Almeirim.
Tentei exprimir o que sempre procurei conhecer sobre a minha terra. Tentei partilhar esse conhecimento com todos.
Talvez tenha contribuído para motivar em alguns o orgulho de serem almeirinenses.
Orgulho que eu tenho, que é ferido pela indiferença de alguns … que assumindo responsabilidades, não acarinham a paixão daqueles que a procuram motivar.
Não há obra de qualidade, sem paixão…haverá apenas a cópia e a standarização.
Não há futuro digno, sem o conhecimento e o respeito pelo passado.
Não há desenvolvimento sustentado, sem uma cultura de exigência social e esta pressupõem a memória colectiva.
Dei uma visão do passado glorioso da história da minha terra…de uma forma simplificada é certo, mas verdadeira.
O objectivo era precisamente esse…ser simples e provocar o interesse e orgulho.
Um simples contributo.
O século XX, já tem muitos e bons narradores…mas também eu irei participando, contando agora histórias de coisas passadas, de um quadro, que pelo menos em parte vivi e que na outra parte me foi narrado por outros mais velhos que o viveram.
Termino em verso… eu que não sou poeta…que a paixão levou ao atrevimento.

Cheiro de Almeirim

Pela Janela entra a uva
Pelo Portão sai o vinho
Tanto trabalho…tanto carinho…
Fermenta o mosto já na cuba

O vinho é aqui, o nosso pão
O meu, é de todos o melhor.
Feito de trabalho e dedicação,
Nenhum outro tem tanto sabor.
O meu vinho é um caso à parte,
É toda a minha arte…
A minha grande criação.

À janela param os carros de bois,
Com celhas de uva dourada,
Saiem do portão os aranhóis,
Correm os cavalos pela calçada.

Quantas adegas…quantas Caldeiras?
De Fazendeiros ou de Lavradores.
Quantos ranchos de namoradeiras,
Tantos bailes e adiafas de alegria,
Quantos Rapazes perdidos de amores…
Quanta saudade, para quem partia.

Coisas que já não se vivem agora,
Privilégio dos que aqui viveram,
E daquelas que por esse mundo fora,
Nesse tempo aqui estiveram.

Havia um cheiro diferente
Que embebedou muita gente
Cheiro que guardo na memória,
Pois nunca houve cheiro assim.
Não há já aranhois, nem aguardente
Era o cheiro dos tempos de glória,
Cheiro que já não se sente,
Que saudade…do cheiro de Almeirim

A última visita Real - História de Almeirim (30)


Os primeiros anos do século XX, anunciavam prosperidade para Almeirim.
As ligações comerciais com o vinho do Porto, criavam uma oportunidade enorme, pois ele seria enriquecido com a aguardente da destilação do vinho da casta Fernão Pires.
Muitas caldeiras de destilação de aguardente vínica foram então construídas na Vila de Almeirim. Todos os grandes vinicultores tinham a sua caldeira e também muitos negociantes construíram a sua própria destilaria.
Este grande número de caldeiras, todas em funcionamento simultâneo, originavam uma enorme azafama de transito e um cheiro muito característico, que misturado com aquele também intenso cheiro do mosto das adegas, produzia o que chamamos o “ Cheiro de Almeirim”.
O Cheiro de Almeirim é nostálgico, para todos os que tiveram o privilégio de o sentir e felizmente eu sou um desses privilegiados.
Das adegas até às caldeiras circulavam uns estranhos carros puxados por cavalo ou por mulas, carregando o casco cheio de vinho ou de água pé.
Era uma azáfama danada, de um lado para o outro de cavalos batendo com os cascos nas ruas de seixo, cujo som já não mais se poderá ouvir.
Esses carros de transportes, também eram uma exclusividade da Vila de Almeirim, os Aranhóis.
Que muito correctamente foram honrados, como símbolo, ao ser um desses exemplares colocado numa rotunda da cidade.
Mas no final da primeira década, novos dramas aconteceram na Vila.
A 29 de Abril de 1909, um forte terramoto com epicentro na zona de Benavente, provocou de novo estragos consideráveis na Vila.
Todo o baixo Ribatejo, em especial as povoações da margem esquerda foram seriamente atingidas, houve muitas vítimas mortais, muita gente ficou sem abrigo e com todos os seus haveres perdidos.
No Natal desse mesmo ano, chuvas torrenciais provocaram a maior cheia de que há memória. De novo a destruição e novas vítimas.
Portugal vivia então uma época muito conturbada social e politicamente. O Rei D, Carlos e seu filho tinham sido assassinados vilmente em plena via pública, na praça do terreiro do Paço, em Lisboa.
Havia um novo Rei, um jovem de dezanove anos, D. Manuel II, que tentava evitar toda uma vasta onda de acções revolucionárias promovidas pelos grupos que pretendiam a instalação do regime republicano.
Este jovem Rei, era incansável na sua acção de atenções para com o seu povo.
Ele esteve em Benavente, a liderar todas as manobras de salvação e apoio quando do terramoto de Abril.
Ele veio a Almeirim para apoiar as vítimas da cheia do final do ano de 1909.
Foi aqui recebido pelo então Presidente da Câmara, o ilustre Dr. Guilherme Godinho, que apesar de ser um distinto republicano, tendo sido o primeiro deputado nacional de Almeirim após a implantação da República, não deixou de cumprir com elegância e simpatia a sua função e recebeu o Rei, com toda a dignidade e agradeceu toda a atenção e preocupação que a sua estadia representava.
Foi a última visita real a Almeirim.

A localização da Ponte sobre o Tejo…um privilégio de Almeirim - História de Almeirim (29)


A primeira ponte rodoviária sobre o Tejo, foi construída entre Santarém e Almeirim.
Ela foi inaugurada no ano de 1881. Na altura com o seu comprimento de 1.213 metros, foi considerada a maior da Península, a 3ª da Europa e a 6ª do Mundo.
Porque razão esta primeira travessia do maior rio português, foi localizada aqui em Almeirim?
A resposta a esta questão, vai levar-nos inevitavelmente à importância histórica da Vila de Almeirim.
Mas sendo esta uma razão com peso, não é suficiente.
Teremos de adicionar à razão desta escolha, outro tipo de análise justificativa.
Havia entre os Almeirinenses personalidades com muita influência política, no reinado de D. Pedro V, pois foi nessa época, que a decisão de construir a linha de caminho de ferro do Norte e a Ponte sobre o Tejo, foi tomada.
Novamente teremos de falar do Conde da Taipa e de seu cunhado o Conde da Torre, pares do Reino e dos outros grandes do reino, que tinham interesses e propriedades em Almeirim.
O Duque de Cadaval, o Duque de Palmela, o Conde da Atalaia, o Barão de Almeirim, o Visconde de Alpiarça, o Conde do Sobral, o Visconde da Junqueira, o próprio Marquês de Saldanha que era Presidente do Governo, tinha aqui em Almeirim laços de afectividade, desde os tempos das lutas contra o General Macena, na última das Invasões Francesas, mas também porque tinha interesses de natureza fundiária.
Todos estes tiveram certamente muita influência na decisão, mas não apenas por uma questão afectiva, sobretudo pelo seu interesse como proprietários rurais e grandes lavradores na margem esquerda do Tejo.
Estamos então em condições de perceber integralmente a verdadeira justificação da decisão de construir a primeira ponte sobre o Tejo entre Santarém e Almeirim.
Almeirim naquela época, era o centro mais importante da lavoura ribatejana. A agricultura era a actividade económica mais importante e aquela que mais deveria ser fomentada e apoiada.
A guerra civil que terminara em 1834, tinha deixado Portugal na miséria, agora havia que alimentar o povo e dinamizar a economia.
Almeirim foi assim também um pólo de esperança para esta mensagem de desenvolvimento económico e a vinha que então já se plantava o seu instrumento principal.
Na sua inauguração, esta tão ansiada obra foi motivo de grandes festejos de que há inúmeros registos históricos.
Mas há uma surpreendente falta de consciência social em Almeirim para com a ponte D. Luís I, que tem de ter também uma justificação.
Uma obra com tal importância para uma terra, há semelhança do que se passa em todo o lado, é venerada e em Almeirim moderna não há quaisquer sinais dessa veneração.
Tudo se justifica, com o que já foi narrado. Na época da inauguração da Ponte bendita, havia uma grave crise social provocada pela praga da Filoxera, que matava e empobrecia.
Como explicamos já, esta grave crise provocada pela praga, originou uma autêntica revolução social.
A recuperação das vinhas de Almeirim, provocou uma nova e mais forte onda de emigrantes que aqui encontravam trabalho e oportunidades.
Muitos destes, chegados nessa altura, enriqueceram e passaram a constituir a nova elite social e económica. Os outros, aqui ficaram porque tinham aqui o que não encontravam noutros lugares.
Mas todos estes, já atravessaram o Tejo, pela nova ponte.
Não tinham na sua memória, a carência e a ansiedade pela obra, pois nunca tinham tido, nem nunca mais tiveram a necessidade de atravessar barcaça, do porto das barcas até Alfange.

A Vila Vinícola e um novo carisma – História de Almeirim (28)


A interligação com o Porto, através do estímulo produtivo e comercial, motivado pela cultura da vinha, originou uma alteração profunda na fisionomia social e arquitectónica de Almeirim.
A Aristocracia dominante foi rapidamente substituída por uma Burguesia de vitivinicultores, que rapidamente adquiriram a maioria do património da nobreza e construíram através de uma arquitectura muito característica, todo um novo conjunto patrimonial, que passou a constituir a imagem dominante da Vila.
A mais expressiva dessa nova imagem, fica expressa pelas grandes casas forradas a azulejo, construídas através da compra de foros públicos em terrenos pertencentes à Casa Real ou ao antigo Paço.
Há volta do antigo terreiro do Paço, que hoje é o Jardim da República, ficava construído um conjunto de edifícios, onde esta nova Burguesia rural se instalou predominante. Também nas ruas que lhe davam acesso. Almeirim passava a ter uma referência arquitectónica de uma época de grande fulgor económico e de desenvolvimento, iniciada na década de oitenta do século XIX e que se irá prolongar para além da primeira metade do século XX.
Dentro da Vila, apenas uma família aristocrata manteve o seu património. A família do Conde de Sobral.
Os herdeiros do Conde da Taipa venderam todo o património, quase na totalidade a Manoel de Andrade.
Integrava este património histórico a Casa onde esteve alojada a Corte de D. José I, na última estadia Real em Almeirim. Também a Casa que fora a antiga Câmara Municipal e onde se instalou o General Júlio Guerra, tendo sido a sede de todo a obra, a que por simplificação chamamos de “construção da vala”.
A própria ermida do Calvário, que era propriedade do Conde e tinha sido reconstruída sobre as ruínas da antiga Capela de S. Roque, onde rezou S. Francisco Xavier, também entrou neste negócio de transferência patrimonial.
O património do Barão de Almeirim, fora adquirido uma parte pela Câmara Municipal, outra pelo grande negociante e vinicultor Prudêncio da Silva Santos.
A Alorna foi vendida a uma sociedade, que no final de alguns anos tinha como único sócio o Dr. Caroça, um rico médico dentista, que havia feito grande fortuna em s. Tomé e Principe.
A dominância social e arquitectónica da Vila, era agora de famílias de emigrantes…os Andrade, os diversos ramos dos Gonçalves, também dos Godinho, os Martins, os Catrola, os Marques da Cruz, os Torrão Santos, os Rodrigues, os Santo, os Tavares… a que se começavam a juntar os profissionais liberais, médicos ou juristas e também comerciantes.
Paralelamente ganhava consistência a mais numerosa e mais simbólica das classes sociais…os Fazendeiros de Almeirim.
A Casa térrea de Almeirim, é o símbolo mais expressivo dessa magnífica e impar classe social, cuja identidade, ultrapassa claramente a sua natureza profissional e é um fenómeno de grande valor social, pela organização familiar que enraizou e pela mentalidade muito própria com que se soube preservar.
O estudo da expressão familiar e social dos fazendeiros de Almeirim, dariam um interessantíssimo trabalho de investigação sociológico, que deveria motivar investigadores ou universitários.
Outra questão de grande importância é o estudo e posterior registo das origens e do inter-relacionamento familiar dos emigrantes chegados, com as famílias tradicionais da Vila Real. Este será o primeiro projecto identificador, para que fique registado para o conhecimento colectivo, com que se inicia o que chamamos “ Projecto Plataforma de Almeirim “.

Heróis de uma luta nacional – História de Almeirim (27)



(Ainda há Fazendeiros em Almeirim - Foto de 2009)

Na última década do século XIX, foram muitos os trabalhadores rurais e os Fazendeiros, de Almeirim e Alpiarça, que foram contratados como enxertadores das vinhas do Dão e do Douro.
Eles tinham adquirido o conhecimento da técnica e muita prática, pois em toda a secada anterior já todas as novas vinhas plantadas no campo de Almeirim, eram feitas através da enxertia do Fernão Pires, no Bacelo Americano, este resistente à praga da Filoxera.
Os vinicultores do Norte sabiam da habilidade e experiência, dos de Almeirim e ofereciam boas remunerações para que estes fossem recuperar as vinhas nortenhas. O que hoje é um património Mundial, foi assim reconvertido pelos homens de Almeirim. Eles foram por consequência os heróis, é certo que bem pagos, da recuperação de um valiosíssimo património nacional.
Mas a importância da sua acção não se ficou apenas por esta acção. Estes contactos dos viticultores do Douro com Almeirim, veio a ter outra importantíssima consequência directa.
As vinhas do Douro estavam em grande declínio produtivo e a sua reconversão demorou vários anos até atingir os níveis anteriores. Mas o mercado do Vinho do Porto, continuava em expansão e estava carente de matéria prima.
Dos contactos estabelecidos, resultou o fenómeno inicial do fabrico do Vinho do Porto passar a ser feito com base no Fernão Pires adquirido em Almeirim. Foi uma necessidade que obrigou os grandes fabricantes do Porto, na sua maioria de origem britânica. Desta necessidade de recurso, passou-se a uma outra, que foi o enriquecimento alcoólico do vinho do Porto, ser feito com a aguardente proveniente do vinho Fernão Pires, produzido em Almeirim e Alpiarça. Foi a grande oportunidade que originou o início das destilarias ( Caldeiras ). A primeira caldeira a ser registada foi a de António Santo, mas logo se seguiram muitas outras, pois o negócio do Vinho do Porto era rentável e seguro.
Também em Almeirim se aprendeu a fazer Vinhos Abafados e Adamados. Excelentes de qualidade, que nunca se consolidaram no mercado, apenas e somente, porque produzir para o Porto era um negócio rentável e seguro e ninguém arriscou em criar uma marca, que pudesse originar uma concorrência directa com os benditos compradores.
Tudo isto veio a dar origem a uma nova onda de emigração, que chegava a Almeirim.
Enquanto a primeira vaga de emigrantes, teve como estimulo a Obra da Vala, esta tinha como estímulo o fabrico e o negócio do Vinho e da Aguardente.
Muitos dos antigos emigrantes, passaram para este negócio como o António Catrola, ou o Prudêncio Santos e fizeram fortunas. Outros foram novos emigrantes que chegavam, já com experiência no mercado e também passaram a ser grandes senhores da terra, como Francisco Marques da Cruz.
Mas para além destes, toda a população beneficiou. Almeirim iria iniciar um período de desenvolvimento extraordinário. A Vila Real, passava a ser uma verdadeira Capital do Vinho.
Com o dinheiro acumulado pelas tarefas temporárias no Dão e no Douro, muitos tabalhdores rurais tiveram condições para adquirir o seu palmo de terra, em especial na charneca e assim se consolidou a classe dominante e de excelência…os Fazendeiros de Almeirim…os heróis da recuperação da vinicultura portuguesa.

A praga devastadora e a crise social - História de Almeirim (26)



Foi na partir do final da década de setenta do século XIX , que surgiu a praga devastadora que matou lentamente uma boa parte dos vinhedos de Portugal.
A Filoxera trouxe uma originou uma grave crise social, pois as vinhas progressivamente foram definhando e lentamente a sua produtividade ia decrescendo.
Cultura que sustentava muita gente, por ser exigente em mão de obra, a crise foi lenta mas muito grave. Os proprietários perdiam a motivação e a capacidade de continuar a contratar os trabalhadores.
A Filoxera foi provocada por um insecto, que se alimentava das raízes das plantas. Os terrenos de aluvião e as vinhas novas e tenras do campo de Almeirim, eram assim um meio muito propício ao desenvolvimento da praga. A praga que na região, apareceu inicialmente na zona de Alenquer, rapidamente se alastrou aos campos do Ribatejo e aí teve um efeito muito rápido e devastador.
Os senhores fidalgos, que também empobreciam, mas que tinham consciência social e preocupações em manter os seus assalariados, criaram a partir de então uma dinâmica que promoveu uma identidade regional, de grande significado. Não tendo dinheiro, mas querendo manter os serviços dos seus empregados, cediam terras em contrapartida dos seus serviços. Os foros cedidos desta forma e originados pela generalizada crise, vieram a criar várias localidades, as Fazendas de Almeirim, os Foros de Benfica, o Casalinho…e mesmo a possibilidade de alargamento urbano nas Vilas de Alpiarça e Almeirim.
Mas o mais significativo, foi que esse processo deu origem a uma classe social, que passou em poucos anos a ser a classe dominante e a mais característica. Os Fazendeiros de Almeirim.
Uma feliz coincidência veio a permitir que Almeirim, passasse a ser o cento nacional da luta contra esta praga devastadora das vinhas de Portugal.
Manuel de Andrade, era filho de uma senhora de Alenquer e aí tinha família também ligada à vinicultura. Ele que tinha sido o responsável geral da obra da Vala, era agora também proprietário vinicultor e simultaneamente administrador do maior proprietário de Almeirim, o Conde da Taipa. Foi através da informação recolhida de seus familiares de Alenquer que conheceu que havia uma forma de combate eficaz à doença devastadora. Através da técnica de enxertia em bacelos de origem americana, resistentes ao ataque dos insectos. Como era uma pessoa decidida e tinha contactos, foi o primeiro a importar de França estes bacelos e a usar a técnica da enxertia.
Nem todos o seguiram inicialmente, preferindo a manutenção das plantações e utilizando o uso de tratamentos com base em sulfitações. Manuel de Andrade antecipou-se e passados poucos anos as suas vinhas encantavam pelo seu vigor e enriqueciam-no através da sua produtividade.
A técnica da enxertia introduzida pelo antigo valador, veio a ser o único método eficaz para a salvação da vinicultura nacional.
Foi por este facto que o Rei D. Luís I, o quis agraciar com um título nobiliárquico, que recusou preferindo manter a sua condição de humildade. Mas este episódio acabou por ser conhecido nacionalmente, pois foi relatado já após a sua morte num órgão de comunicação social de expressão nacional, a Revista Comércio e Indústria.
Almeirim, conseguiu ultrapassar a crise e voltou a ter na vinha e no vinho, a motivação para o seu desenvolvimento.
Mas mais ainda, como narraremos mais adiante, Almeirim e os Fazendeiros de Almeirim, foram determinantes para a recuperação da viti-vinicultura portuguesa e muito especialmente para a reconversão que posteriormente veio a ter lugar dos vinhedos do Douro, salvando-se assim esse importantíssimo património nacional que é o Vinho do Porto.

Os primeiros Emigrantes - História de Almeirim (25)



A primeira vaga de emigrantes com significado, chega a Almeirim através desta dupla motivação.
A obra do Vale do Tejo, que tinha a sua sede e coordenação na Vila, em simultâneo com a necessidade de mão de obra para a cultura da Vinha.
Acontece a partir da segunda metade dos anos cinquenta do século XIX.
Entre estes emigrantes, surgem desde logo, alguns com instrução e qualificação profissional.
O Coronel Júlio Guerra recruta para a sua equipe, pessoas que já conhecia, ou por terem feito a tropa sob as suas ordens, ou porque já haviam participado em outras do mesmo género, que ele coordenara. Uma equipe de jovens originários do Vale do Mondego ou da zona de Minde.
Nomeou como principal responsável dessa obra, um jovem, mas já experiente, que conhecia bem, chamado Manoel de Andrade. Este era natural de Paião, Concelho da Figueira da Foz e já exercia uma actividade própria como “Valador”, ou seja construtor civil de obras de hidráulica agrícola, na região do Baixo Mondego. Tinha feito a tropa integrado no Batalhão do Coronel Júlio Guerra em Coimbra.
O curso da antiga Vala (Alpiaçoulo) foi alterado e uma nova linha de água foi construída, a Vala de Alpiarça. Foram construídas três pontes e duas novas estradas. A ponte de Alpiarça, a ponte de Benfica do Ribatejo (a última a ser construída) e a nova Ponte de Almeirim (a Ponte Velha). Duas estradas passaram a ligar a Ponte de Alpiarça e a Ponte de Almeirim, directamente à Tapada, onde então já estava situado um dos estaleiros para a construção da Ponte D. Luiz I.
Com a mudança do curso da antiga Vala, fica liberto muito terreno, que passa a ser considerado público. Esses terrenos são divididos em lotes, são faixas paralelas entre a antiga linha de água e a moderna. Esses lotes, são numerados e colocados á venda em hasta pública. São vários o emigrantes, responsáveis e trabalhadores da obra, que compram esses lotes. Ainda hoje, muitas propriedades, têm o nome de registo decorrente da numeração de lote que lhe foi atribuída. Os “Vinte Cinco”, os “Catorze”, os “Dezoito”, outras já não têm essa identificação através de números, porque os seus novos proprietários, lhe deram outros nomes no acto de registo.
A década de sessenta, inicia uma mudança radical na Vila Real de Almeirim. Novas gentes e nova motivação, mais visitantes pela nova acessibilidade. Muitos dos que vieram para a obra, ao adquirirem património, consolidaram-se como vinicultores e em Almeirim passaram a viver para sempre. Outros que perante o desenvolvimento, que tudo isto proporcionava, abraçaram outros ofícios ou criaram actividades de comércio. Muitos deles, acabaram também por constituir família por casamento, ligando-se às famílias locais.
Nessa época com a Vala Nova, também se instalam junto a ela, alguns pescadores “Avieiros”, que construíram pequena aldeias “palafíticas”, sobretudo entre Almeirim e Benfica do Ribatejo. Eram eles, que forneciam peixe fresco ao mercado de Almeirim. Também destes há muitos descendentes em Almeirim.
São estes novos emigrantes chegados a Almeirim desde a década de sessenta do século XIX, que irão estar na base de toda a evolução da Vila Real, para a Vila Vitivinícola e de toda a incrível evolução e desenvolvimento, que protagonizaram.
A Vinha foi a motivação. Almeirim crescia e desenvolvia-se, sustentada numa corrida á oportunidade de riqueza que o Vinho e a Aguardente, proporcionava.
Fazer um trabalho consistente de busca e pesquisa dos nomes, das suas origens das suas raízes, da sua obra e actividades, da sua ascendência e descendência, é um dos primeiros objectivos do projecto a que chamamos “Plataforma de Almeirim”. Será pois um contributo, a que todos podem dar a sua colaboração, através da sua informação familiar, que contribuirá em muito para motivar o “orgulho de ser almeirinense” e para a recuperação da nossa memória colectiva. Será um projecto de todas as famílias e de toda a sociedade civil de Almeirim. Um projecto histórico e cultural que permitirá uma nova “identificação” de cada um de nós, e uma reforçada ligação afectiva à nossa terra.

O Milagre da Vinha- História de Almeirim (24)



A Vinhas plantadas no campo, foram um sucesso produtivo de grande significado. O sucesso das experiências do Visconde da Junqueira, na Alorna, levou todos os grandes proprietários, a seguir o seu exemplo.
A casta Fernão Pires passou a ser a heroína da produtividade vinícola nacional.
Em meados dos anos cinquenta do século XIX, já as vinhas tinham uma grande expansão no campo de Almeirim. Foi a partir de aqui que se expandiram para os restantes concelhos onde havia também campos de aluvião.
O Duque de Cadaval planta vinhas nas suas propriedades de Salvaterra e Benavente. O Duque de Palmela em Alpiarça e Chamusca. Ainda em Alpiarça, a família Sousa Falcão faz enormes plantações. O Barão de Almeirim leva a cultura para o Rossio da Ribeira de Santarém e Alcanhões. O Conde da Taipa, assume-se como grande vinicultor em Almeirim e planta a vinha nas terras de sua mulher, a Condessa de Valada, no aluvião da margem direita do Tejo, no Concelho do Cartaxo. Ainda o Conde da Atalaia, cuja sede de Casa Agrícola era a Quinta de Santa Marta, em Benfica, implanta aí a cultura e também nas terras que possuía no Concelho de Santarém e Cartaxo. O Conde de Sobral e o Conde da Torre também aderem à dinâmica e nas suas propriedades do Casal Branco e da Gouxaria instalam vinhas e adegas.
É assim a partir de Almeirim, que a vinha se expande e divulga por todo o Ribatejo. Esta nova actividade com elevado interesse económico vai originar decisões políticas de elevado interesse regional.
A influência dos nobres proprietários de Almeirim, associada ao seu interesse pela nova cultura que estava em franca expansão, pressiona a decisão de o Governo levar a cabo a grande obra de defesa e drenagem dos campos do vale do Tejo.
O Coronel Manuel José Júlio Guerra é nomeado como responsável pelo reconhecimento do terreno e como coordenador da obra e instala-se em Almeirim, em instalações cedidas pelo Conde da Taipa. É o este grupo do Coronel Júlio Guerra que faz o primeiro levantamento cartográfico de Almeirim e publica a primeira planta da Vila Real.
Com o início desta obra, a que normalmente chamamos, de uma forma redutora, “ a construção da Vala de Alpiarça”, chega a primeira grande onda de emigrantes, que para ela vieram trabalhar e em que a maioria se instala definitivamente em Almeirim. No entanto para que fique mas claro o interesse público dessa obra, é importante referir que foram recuperados algumas centenas de hectares de terras pantanosas, que foram realizados vários diques que ainda hoje defendem o campo dos aumentos de caudais do Tejo, que foi regularizado o leito do Tejo, do Alpiaçôlo (Vala de Alpiarça) e da Vala Real (Vale de Santarém), em que foram também construídas novas pontes e estradas. Foi uma obra de grande importância e envergadura que se prolongou por cerca de duas décadas, como se comprova pela data ainda visível (1876), colocada na ponte de Benfica do Ribatejo.
Mas esta dinâmica económica, também influenciada pelo interesse directo dos nobres proprietários, veio a ocasionar uma outra obra, que possibilitou toda a nova vocação de Almeirim e passou a ser determinante para o seu desenvolvimento económico e social.
Foi a decisão de realizar a primeira ponte viária sobre o Tejo, precisamente entre Santarém e Almeirim. Essa decisão está indiscutivelmente ligada ao reconhecimento politico na época de que a Vila Real de Almeirim, era agora a protagonista de uma dinâmica económica que havia que apoiar. Com a nova Ponte, D. Luís I, Almeirim ficava ligada directamente por via viária e rápida ao Caminho de Ferro, pois entretanto também a linha do Norte tinha sido construída.
Almeirim estava agora ligada ao mercado de todo o território, estava eliminado todo o seu isolamento, precisamente quando encontrou a sua nova vocação. Todas as portas para o seu desnvolvimento tinham sido abertas.

A nova vocação da Vila Real - História de Almeirim (23)


Não deixa de ser interessante a verificação de quem são os destinatários da obra das “Viagens na Minha Terra” de Almeida Garret. São eles, Passos Manuel , Manuel Nunes Freire da Rocha ( Barão de Almeirim) e D. Gastão da Câmara Coutinho Pereira de Sande (Conde da Taipa).
Todos eles com fortes ligações a Almeirim.
Pelo casamento, como foi o caso de Passos Manuel, pois sua mulher era da família Sousa Falcão de Alpiarça, tendo vivido após a sua retirada da política na Quinta da Torre em Alpiarça. Pelas responsabilidades administrativas e políticas na Vila Real e título de Barão de Almeirim, o natural do Pombalinho, Manuel Nunes Freire da Rocha. Por ser um filho da terra e seu grande benfeitor, a mais prestigiada figura nobre almeirinense, o Conde da Taipa.
Poder-se-á pensar tratar-se apenas de uma cortesia de amizade de Almeida Garret, mas penso que essa seria uma análise simplista, pois para além dela, estará também a percepção que durante a sua estadia de que Almeirim assumia efectivamente, ainda nessa época, uma centralidade social e económica, dominante em todo o Ribatejo.
Corrobora neste sentido a notícia que pode ser lida na “Cronologia de Almeirim” do Prof. Jorge Custódio. Aí se dá nota que em 1835, “os homens bons de Almeirim organizam-se para facilitar a venda dos bens nacionalizados às Ordens Religiosas”.
Efectivamente assim foi. Os grandes senhores que já possuíam bens em Almeirim organizaram-se para adquirir as propriedades nacionalizadas e reforçaram substancialmente os seus domínios patrimoniais. Por isso o liberalismo não originou directamente a divisão da propriedade e muito pelo contrário originou a sua concentração. Porém essas propriedades passavam agora a ser grandes explorações agrícolas, geridas por grandes Lavradores, muitos deles descendentes de antigos nobres, outros da nova nobreza e outros ainda simplesmente homens de negócios, que no advento da produção empresarial agrícola pretendiam investir o seu dinheiro na actividade económica dominante.
Destas grandes Casas Agrícolas que então se formaram no Concelho de Almeirim e que lideraram todo o processo da modernização agrícola nacional, ainda hoje existem imponentes referências, que apesar das divisões a que foram sujeitas, por partilhas ou por destaques para venda, dão-nos uma ideia precisa da imponência que deveriam ter naquela época: A Casa Cadaval em Muge; A Quinta de Santa Marta em Benfica; o Casal Branco do Conde de Sobral de que foi destacado o Convento da Serra e o Casal Monteiro; o Mouchão do Alfange na Tapada; a Padilha em Almeirim; a Alorna; a Goucha e Goucharia e os domínios dos Mascarenhas que incluía um vasto património anexo à actual Calha do Grou; a Quinta da Torre que fazia parte de uma enorme propriedade da família Sousa Falcão; a Lagoalva e os seus anexos do Duque de Palmela…
Nessa época estas grandes Casas Agrícolas, detinham em Portugal as maiores produtividades quer na produção de cereais, quer na produção pecuária. Também foi nas várzeas da Ribeira de Muge que se iniciou a moderna cultura de arroz, através da iniciativa de José António Pinhão que se instalou na zona da Raposa, a partir do ano de 1830. Foi também nessa época que a Coudelaria do Casal Branco se distinguia em todo o país pela qualidade dos seus cavalos. Ela tinha sido fundada pelo Barão de Sobral e foi atingindo o auge do seu prestígio, pela acção e dedicação do 3º Conde de Sobral, D. Hermano Sobral de Melo Breyner.
É muito interessante a verificação dos fenómenos que acontecem em Almeirim, em que a agricultura como actividade económica, era quase exclusivamente determinada pela grande exploração agrícola e se vai transformar, num curto espaço de tempo, numa terra de emigrantes e onde vai ser dominante uma nova classe de agricultores de pequena dimensão, os Fazendeiros de Almeirim.
Este interessantíssimo processo de evolução, tem a sua primeira origem na venda da Quinta da Alorna em 1843, a José Dias Leite Sampaio e que recebera o título de Barão da Junqueira.
O Barão da Junqueira, que era um banqueiro e um muito abastado homem de negócios, irá tudo revolucionar com os seus investimentos. Ele planta um enorme olival e constrói o primeiro Lagar de Azeite movido a vapor.
Mas a sua obra mais importante foi as diversas plantações de vinha e a adega para fabrico dos vinhos.
O êxito produtivo das vinhas do Junqueira, plantadas no campo (aluvião), foi de tal forma grande pela produtividade que a casta escolhida tinha, que essa casta histórica, o Fernão Pires irá ser a paixão abençoada de todos os outros proprietários e até dos trabalhadores rurais, que começavam a chegar para os trabalhos das vinhas.
Todos quiseram também plantar vinhas no campo. Todos quiseram adquirir terras no campo.
Criou-se uma verdadeira euforia. Almeirim tinha encontrado finalmente a sua vocação que irá tudo mudar.
A Vila Real irá agora caminhar para a Vila Vitivinicola e irão vir muitos emigrantes, ou seja os antepassados da maior dos almeirinenses dos nossos dias.
Mas nem tudo irão ser rosas e uma praga irá originar actos heróicos de resistência, uma luta de sacrifícios e uma autêntica revolução social.

Um grande Benemérito de Almeirim; O Conde da Taipa -História de Almeirim (22)


Após o período da guerra civil (1828-1834), consolida-se em Portugal a Monarquia Constitucional. É agora rainha D. Maria II e profundas alterações se irão produzir, pela emergência de uma nova nobreza, pelo surgimento de uma burguesia com influência económica e politica e pelo surgimento de uma classe dominante no mundo rural, que prioritariamente de instala no Ribatejo, os Lavradores. A estes Lavradores se ficará a dever uma boa parte da evolução económica, através da modernização da agricultura portuguesa.

Almeirim foi o centro de toda uma transformação radical dos processos agrícolas, foi o centro de divulgação da mecanização agrícola, que originou a sua modernização e o seu desenvolvimento, podendo mesmo afirmar-se que Almeirim na década de quarenta do século XIX, foi o mais importante centro nacional de experimentação agrária e da sua mecanização.


Para que se perceba melhor porque assim foi, é preciso recordar algumas personagens, que foram decisivas pela sua acção e influência política na época. O primeiro que devemos enaltecer é o Conde da Taipa, que foi o grande e incansável lutador e promotor das duas obras que vieram trazer a nova vocação a Almeirim e estão na base de toda a sua evolução até aos nossos dias. A obra de enxugo e drenagem do Vale de Tejo, que entre nós se costuma chamar “obra da Vala de Alpiarça” e a localização da ponte sobre o Tejo entre Santarém e Almeirim, que irá permitir o escoamento e a ligação fácil dos produtos aos mercados, pela utilização do comboio.


D. Gastão da Câmara Coutinho Pereira de Sande era almeirinense nascido em 1794, filho de D. Luís e neto de D. Gastão da Câmara Coutinho, aquele que recebeu D. José I em sua casa, quando da última estadia da Corte em Almeirim.


Muito jovem foi com a Corte para o Brasil em 1807. Foi assim educado junto de D. Pedro e de D. Miguel, futuros reis de Portugal. No Brasil iniciou a sua carreira militar e voltou para Portugal juntamente com toda a Corte de D. João VI, no ano de 1821. Da sua amizade com D. Miguel, resultarão as inúmeras estadias do Infante em Almeirim e também a sua participação na Vilafrancada.


Com o juramento do Rei D. Miguel da Carta Constitucional, em 1826, é nomeado Par do Reino e inicia uma brilhante carreira política, passando para a história a sua indiscutível coragem e determinação. A sua mais destacada acção politica irá ser a de assumir o principal protagonismo na defesa da conciliação entre a Constituição de 1822 e a Carta Constitucional. Participou na “Belfastada” ao lado do Duque de Saldanha, seu amigo e como ajudante de ordens do Duque de Palmela. Teve por consequência uma acção política e militar determinante de que resultou a Constituição de 1838. De entre os episódios mais notáveis de que foi protagonista, destaca-se a carta que escreveu a D. Pedro IV e que publicou, exigindo o levantamento dos sequestros, a liberdade de todos os sequestrados e a liberdade de imprensa, o que lhe valeu a ordem de prisão. Essa prisão do Conde da Taipa, originou um movimento de apoio de muitos outros Pares do Reino, seus amigos e alguns deles com ligações patrimoniais a Almeirim, como o Duque de Palmela e o Conde da Torre, D. José Trazimundo de Mascarenhas, neto da Marqueza da Alorna “Alcipes”, que era seu cunhado.


D. Gastão, o Conde da Taipa foi também amigo de Almeida Garret e acompanhou-o durante as suas visitas ao Ribatejo, sendo um daqueles a quem o escritor dedica “as Viagens da Minha Terra”. Casado com D. Francisca de Almeida e Portugal, Condessa de Valada, não teve descendência. Seus herdeiros dos títulos, foram seus irmãos Manuel e José, respectivamente 2º e 3º Conde da Taipa, mas que nunca chegaram a ter uma relação de interesse por Almeirim, tendo vendido todo o património local herdado.


Para melhor perceber quanto era influente e respeitado em Almeirim, basta relembrar o que escreveu o médico Tiago do Couto, que aqui vivei entre 1855 e 1859, no seu livro “Breve Notícia de Almeirim”, que foi editado pela Associação de Defesa do Património em 1991 e que aconselho vivamente a todos.


“…de Verão há mais animação na Vila; há os descantes, os bailes de roda, as eiras, as descamisadas dos milhos e após elas os fabricos dos vinhos, em suma há mais distração mas a convivência é pouca…Quando Sua Exª, o senhor Conde da Taipa está em Almeirim o que sucede frequentes vezes no ano, então o caso é outro. Recebe em sua casa alguns indivíduos em cujo número eu entro. Fala-se da Lavoura, de literatura, de tudo; e sua Exª então mostra a vastidão dos seus conhecimentos científicos. O tempo assim não corre – voa.”


A rua Conde da Taipa é a única referência actual a este Homem, que foi essencial para o progresso da sua terra, Almeirim. Nessa rua ainda está, apesar de muito modificada, não tanto na traça e mais nos revestimentos de pedra das cantarias e fachadas, a casa onde viveu e nessa época, todos as terras que iam para o lado de Alpiarça eram dele, incluindo a Gouxaria, que acabou por destacar após partilhas, com seu cunhado D. José Trazimundo Mascarenhas. Essa casa depois de sua morte em 1866, foi comprada a seus herdeiros, por um seu amigo e administrador, Manoel de Andrade, que era meu trisavô.

A nova divisão administrativa: História de Almeirim (21)- A querela da água


Em 1836 o Governo dirigido por Manuel da Silva Passos, que ficou conhecido como “Passos Manuel” faz publicar o novo Código Administrativo. Nesse Código Almeirim mantêm-se sede de Concelho com as seguintes cinco Freguesias : S. Estáquio de Alpiarça (Alpiarça); S. João Baptista (Almeirim); Santa Marta de Monção (Benfica do Ribatejo); Santo António da Raposa ( Raposa) e a Paróquia de Muge (Muge).

A grande alteração está no facto de Alpiarça, que até então pertencia administrativamente a Santarém, passar a pertencer ao Concelho de Almeirim. A história da relação entre as duas terras é muito curiosa e não chegará a completar um século. Mais do que fazer uma narração, prefiro deixar uma história curiosa dessa relação e que sintetiza os momentos de união e de separação.


A querela da água. Origem da animosidade entre Almeirim e Alpiarça.


A aldeia da Ponte de Alpiarça teve um forte desenvolvimento a partir da venda em hasta pública das terras e património das Ordens religiosas e também do Infantado. Em Alpiarça instalaram-se muitos novos Lavradores, que adquiriram parcelas desses patrimónios.
Almeirim mantinha nessa época ainda uma dominância de casas fidalgas, que nas suas imediações tinham grandes propriedades. Eram estes fidalgos de Almeirim homens importantes, alguns deles Pares do Reino, como o Conde da Taipa, o Conde da Torre e o Duque de Cadaval, mas também outros grandes senhores como o Conde de Sobral, o Barão de Almeirim, o Barão de Alvaiázere, o Conde da Atalaia e a Marquesa da Alorna.
A aldeia de Alpiarça fora colocada sob a dependência administrativa de Almeirim, pela reforma de Passos Manuel, tendo ele próprio adquirido património nesse local, ou herdado por ser casado com uma senhora da família Sousa Falcão, que ainda hoje em dia é pertença de seus descendentes e herdeiros, a quinta da Torre.
Como resultado directo da Revolução Liberal, Alpiarça teve uma maior dinâmica de crescimento, pois esses novos Lavradores passaram a fazer uma exploração empresarial das terras adquiridas, enquanto em Almeirim ainda vigorava um regime de exploração da propriedade mais do tipo feudal, com recurso ao regime da enfiteuse, do foro e do arrendamento. A grande casa agrícola de Alpiarça era a da família de Sousa Falcão, que teve uma enorme importância na divulgação de novas técnicas culturais e na mecanização em toda a agricultura portuguesa. Esta dinâmica empresarial irá chegar a Almeirim, até como muito mais intensidade e dinamismo, mas em momento posterior, em que assume particular importância o facto da Quinta da Alorna ter sido vendida em 1843, a José Dias Leite Sampaio, o Barão da Junqueira, que sendo um magnata de Lisboa, faz grandes investimentos que irão contribuir para uma mudança radical de toda a agricultura almeirinense e a posterior alteração da estrutura fundiária e social.
A integração administrativa de Alpiarça no concelho de Almeirim, veio a originar uma situação de permanente participação conjunta de elementos das duas terras na Vereação e na Presidência da Câmara. Foram treze os Presidentes da Câmara de Almeirim no período desde 1839 até ao ano de 1894, que eram habitantes de Alpiarça e quando não tinham a presidência era-lhes sempre garantida a vice-presidência. Tudo isto representava uma atitude de bom senso político, que conseguia manter um equilíbrio e um bom relacionamento, entre a sede do concelho e a sua aldeia mais importante.
Porém em 1894, sendo Presidente o almeirinense Deodato Rodrigues Pisco e Vice- Presidente por Alpiarça, António da Silva Patrício, estabeleceu-se uma querela que viria a originar uma animosidade entre as duas populações, que está na origem de toda a acção reivindicativa de transformação em Concelho de Alpiarça, o que só veio a acontecer em 1914, já em plena República, seis anos depois de ter sido elevada à categoria de Vila, o que aconteceu portanto, durante o reinado de D. Manuel II.
Tudo começou pela proposta do Presidente da Câmara, de utilizar metade de um fundo, que estaria depositada na Caixa Geral de Depósitos, para construir uma Capela no Cemitério e para fazer obras de abastecimento de água na sede do Concelho. O Vice-Presidente reivindica também verbas para obras de abastecimento de água em Alpiarça, que bem carecia, porquanto muitos utilizavam a água férrea da fonte da Atela, perto do Casalinho, longe portanto, ou então, todos os que não tinham poços em suas casas, tinham de mendigar aos mais abastados a água para beber.
A querela tomou tais proporções, que á inauguração da nova Igreja de Alpiarça, que decorreu no dia 11 de Agosto daquele ano, não compareceu nem o Presidente da Câmara, nem ninguém de Almeirim. Estava estabelecida a animosidade, que com esta reacção ainda mais se agudizou e servirá de pretexto em Alpiarça para um movimento reivindicativo que se generalizou por toda a população, que visava a sua classificação como Vila e a sua autonomia como sede de concelho.
Em Almeirim esta querela da água, associada ao movimento separatista que passou a ganhar consistência, originou uma reacção popular que era expressa na seguinte imagem…se querem ser independentes irão andar para trás pois tem sido Almeirim que tem apoiado o desenvolvimento de Alpiarça…de uma forma mais simplificada passou o povo almeirinense a dizer…fiquem com a vossa água e andem para trás…que se veio a simplificar ainda mais…”beber água de Alpiarça é andar para trás”.
Esta era a frase que ofendia os habitantes de Alpiarça, que tantas e tantas vezes foi proferida pelos de Almeirim, que ficou como símbolo da animosidade entre as duas terras. Ainda em meados do século vinte era frequente ser pronunciada depreciativamente pelos almeirinenses quando se referiam aos habitantes da terra vizinha.
A animosidade provocada pela querela da água, entre os habitantes de Almeirim e Alpiarça, foi até evidenciada no Parlamento quando da apresentação da proposta de Lei de elevação de Alpiarça a sede de Concelho e por muitos deputados foi feita a interpretação, que a proposta apenas tinha como motivação a animosidade entre as duas terras. A proposta acabou por ser aprovada, mas com muitos votos contrários. Valeu o prestígio e a influência do deputado José Relvas, que bem se esforçou nesse momento, para conseguir mobilizar os votos suficientes para a sua aprovação.

O Legado do Rei D. Miguel I. História de Almeirim (20)


I Infante D. Miguel era o mais rico homem de Portugal. Depois do assassínio de seu pai o Rei D. João VI, foi Regente e mais tarde aclamado Rei de Portugal. Ele é aclamado Rei em Almeirim em 1828, na presença do Juíz José Casimiro Salgado e com o apoio popular. Acusaram-no então os liberais de usurpador do trono e gerou-se uma gravíssima crise, que veio a originar uma guerra civil, que só veio a terminar com a convenção de Évora Monte em 1834 e o exílio de D. Miguel.
Durante esta guerra civil são narrados em 1833, levantamentos liberais em Almeirim quando as tropas do Rei, estavam sediadas em Santarém. Após a tomada de Santarém a 18 de Maio de 1834, as tropas liberais atravessam o Tejo e entram em Almeirim, onde há notícias de saqueamento do Paço, descrito por alguns historiadores, que confirmam assim que nessa época ainda existia o edifício, ou pelo menos uma parte dele . Em Almeirim acontece então o Auto de Aclamação da rainha D. Maria II e do Regime Constitucional. É na sequência desta aclamação, que é nomeado o Dr. João César Henriques como primeiro presidente liberal da Câmara de Almeirim.
É também na sequência da vitória liberal e imediatamente após a convenção de Évora Monte , que se extinguem as Ordens Religiosas e se nacionalizam todos os seus bens. Esta medida irá ter uma enorme influência para a evolução futura de Almeirim. Dessa evolução e dos seus principais agentes e protagonistas, trataremos nos próximos capítulos.
Agora realcemos a particular importância de um legado de D. Miguel I, para Almeirim, para o Ribatejo e para Portugal.
D. Miguel tem um papel determinante na restauração das Corridas de toiros em Portugal e também como iniciador de uma nova forma de seleccionar e criar toiros bravos. É a ele que se deve toda a moderna evolução tauromáquica nacional, que nos distingue de Espanha e que origina o mais popular dos espectáculos nacionais até meados do século XX.
Desde que o Marquês do Pombal decretara o fim das Corridas Reais, em sequência da morte do Conde de Arcos numa corrida em Salvaterra de Magos, a Tauromaquia tinha entrado em estado latente de expressão, pela não participação dos nobres nos festejos tauromáquicos. Havia em Lisboa a Praça de Salitre e continuou a haver muitos festejos tauromáquicos locais, mas sem ordem nem rigor, que os transformava mais em “largadas de toiros”, do que em espectáculos de natureza artística. Foi D. Miguel que tudo mudou.
D. Miguel, ele próprio cavaleiro toureiro, recebeu de oferta de seu tio Fernando VII, rei de Espanha, uma vacada e cria a primeira ganadaria portuguesa, com características adaptadas à evolução do toureio moderno. Essa ganadaria que instala em terras do Infantado, na zona de Samora Correia, chegou a ser a maior ganadaria de toda a Península com mais de 5.000 reses. Esta ganadaria é a origem de muitas outras, que posteriormente surgirão, através da aquisição de “pontas de vacas” e de sementais, dos Lavradores ganadeiros que se irão instalar nos campos do Ribatejo.
D. Miguel manda construir a Praça de Toiros do Campo de Santana e é essa praça que irá assumir o protagonismo do relançamento dos espectáculos tauromáquicos e da afirmação do toureio equestre português. O êxito dinamizador da Praça do Campo de Santana foi tão importante, que origina que por todo o país, de Norte a Sul, centenas de novas praças de toiros sejam construídas para ver actuar as figuras do Conde do Vimioso, do Marquês de Vilar Maior, de Carlos Relvas e a nova ordem que incluía já os Forcados, pegando os toiros como culminar das lides.
Muitas foram as estadias em Almeirim de D. Miguel, que sempre motivavam organização de touradas, quer na Alorna, na Goucharia e mesmo nos largos da Vila. Esta semente de aficionados que D. Miguel recriou em Almeirim, terá como consequência o estabelecimento de muitos criadores de toiros no Concelho, o surgimento muitos e destacados almeirinenses toureiros, de que ainda há sucessores de grande destaque nacional, nesta primeira década do século XXI. Será a razão que motivou a existência das mais de nove praças, que estão identificadas como tendo existido em Almeirim, como resultado natural da popularidade que a tauromaquia aqui sempre teve, pois Almeirim foi efectivamente em termos históricos o “berço” da tauromaquia portuguesa.
O Infantado foi nacionalizado e todo o seu vasto património fundiário irá ser vendido em hasta pública. Da venda pública deste património e também do das Ordens Religiosas, irá surgir uma nova classe social determinante para a dinâmica nova que surgirá através deles, os Lavradores do Ribatejo.

Estagnação; Alcipes e o pré romantismo – História de Almeirim (19)


No período que decorre entre o terramoto de 1755 e as Invasões francesas, Almeirim é objecto de diversas tentativas para criar uma nova vocação para a Vila.
Em 1771, na Quinta do Vale de Nabais (Alorna) é iniciada uma enorme plantação de amoreiras, com o objectivo de produção de seda. Esta plantação decorre muito provavelmente do que tinha observado D. João de Almeida, quando da sua estadia na Índia, acompanhando seu pai D. Pedro que foi o 32º Vice Rei da Ìndia. Criar em Portugal um centro de produção de seda foi assim a primeira ideia consistente para dar uma nova vocação a Almeirim. Na sequência desta experiência e nova visão, a Junta da Administração das Fábricas decide instalar em Almeirim a real Fábrica de Algodões da Vila, no ano de 1772. No entanto esta iniciativa não veio a ser consistente porquanto dois anos depois esta fábrica é transferida para Alcobaça, por alvará régio. Mantêm-se porém em Almeirim escolas de fiação e ainda uma secção (partido) manufactureiro de tecidos.
Tinha entretanto, toda a região sido negativamente afectada com o decreto do Marquês do Pombal que impôs o arranque de todas as vinhas do Ribatejo. Pretendia-se com ele dar uma vocação cerealífera aos campos do vale do Tejo e salvaguardar a produção de vinho do Douro. Não era fácil motivar a produção de cereais nos campos do Ribatejo, pela frequência das cheias que introduziam um adicional factor de risco para esse tipo de aproveitamento cultural.
É assim que, durante cerca de quarenta anos, Almeirim está sujeita a um certo impasse pois não foi encontrada uma nova vocação de sucesso, que promovesse sustentadamente o seu desenvolvimento. A coutada real já não era frequentada e a sua guarda não impedia a caça furtiva e a recolha ilícita de mato para estrume das hortas e da agricultura de subsistência que os naturais iam fazendo. Essa ausência de fiscalização, associada aos descuidos, deram origem a vários incêndios alguns deles de elevada proporção.
É precisamente nesse período, em 1792, que o Príncipe Regente D. João VI, ordena a demolição o Paço de Almeirim e nomeia o Conde Soure como provedor dessa execução. Nessa decisão extinguem-se os cargos de almoxarife do Paço, de escrivão, de mestre de obras e de relojoeiro. Curiosamente nessa ordenação dava-se a instrução para que todos os destituídos desses cargos teriam direito a serem pagos, enquanto fossem vivos. Esta ordenação de demolição vai durar muitos anos até ser integralmente cumprida.
Foi também nesse período que se instalou em Almeirim a poetisa Alcipes, Dona Leonor, futura Marquesa da Alorna, na companhia de seu pai D. João de Almeida Portugal, após um prolongado cativeiro de 18 anos, por ser da família Távora e pela acusação de ter emprestado uma espingarda aos conjurados do atentado real. Dona Leonor permanece em Almeirim, onde certamente escreveu muitos dos seus poemas, até ao ano de 1779, quando se casou com o Conde de Oyenhausen e viajou com ele para Viena de Austria. Só voltará a Almeirim após as Invasões Francesas e então aqui permanece primeiro numa luta tenaz pela recuperação do património que fora confiscado a seu irmão D. Pedro, acusado de traidor e condenado à morte por D. João VI e depois vivendo faustosamente e organizando no Palácio da Alorna os célebres saraus políticos e culturais, onde se divulgavam os ideias liberais, de que era militante activa pois foi fundadora da célebre Sociedade da Rosa, organização determinante na difusão do movimento liberal.
Almeirim foi assim também um palco importante do pré romantismo e a Alorna um centro cultural de grande relevo histórico.

Novamente o “Espírito de Almeirim” – Invasões Francesas – História de Almeirim (18)

A Revolução Francesa, o Império Napoleónico e as Invasões Francesas, irão influenciar toda a política nacional e provocar grandes alterações sociais e económicas que se exprimirão em Portugal através da Revolução Liberal e da Guerra Civil.
Almeirim foi palco de um notável e importantíssimo episódio que foi decisivo para a preservação de Portugal como Reino, durante a 3ª Invasão comandada pelo General Massena.
Massena e suas tropas chegaram até Santarém e aí estacionaram, com o objectivo de cercar Lisboa e conseguir vencer Beresford. Para tal definiam como estratégia essencial atravessar o Tejo para cercar a capital também pela margem sul. O Comandante da Legião Portuguesa ao serviço de Napoleão era D. Pedro de Almeida e Portugal, o 3º Marquês da Alorna e por conseguinte um almeirinense.
A população de Santarém foge com a chegada de Massena e pelo porto de Alfange atravessa o Tejo e refugia-se em Almeirim e Alpiarça, onde é muito bem acolhida.
As tropas Luso-Britanicas, mais propriamente o Comando de cavaria 10, comandadas pelo Visconde de Barbacena, acampam no campo de Almeirim para evitarem a travessia de Massena e da Legião Portuguesa. Como curiosidade refira-se que integrava esse corpo de cavalaria o jovem Alferes Bernardo de Sá Nogueira, futuro Marquês de Sá da Bandeira. Durante essa estadia fazem os franceses diversas tentativas de atravessar o Tejo, sempre infrutíferas pois são sistematicamente derrotadas pela acção deste exercito que teve sempre o apoio da população de Almeirim e Alpiarça. Este apoio não foi apenas logístico mas também de participação directa em todas as lutas e escaramuças que se sucederam, durante um largo período de tempo. Esta população heroica , tinha ainda presente o tão nobre Espírito de Almeirim e contribuiu decisivamente para a derrota da ultima tentativa de Napoleão Bonaparte de conquistar o Reino de Portugal.
Como consequência directa da participação do 3º Marquês da Alorna ao lado de Napoleão, o Príncipe Herdeiro D. João, futuro Rei, confisca todos os seus bens e declara a sua condenação à morte. D. Pedro de Almeida Portugal acaba por vir a morrer na campanha da Russia, ainda ao serviço do Imperador. Uma parte da Quinta da Alorna ( o Mouchão de Alfange) é destacada e entregue como mercê ao Barão de Alvaiázere. Uma parte de um destacamento da Coutada Real, na zona de Alpiarça, é entregue como mercê a João de Sousa Falcão, que recebe em 1814, também o título de Visconde de Alpiarça. A partir de então a família Sousa Falcão passa a ser a família dominante da então aldeia de Alpiarça, que só posteriormente através da reforma administrativa de Passos Manuel, passou a integrar o Concelho de Almeirim.
O importante agora é registar que esta estadia das tropas Luso-Britanicas nos campos de Almeirim, criaram em vários dos militares aqui estacionados laços com os locais e alguns deles passaram vieram a adquirir património no local, nomeadamente o Marquês de Sá da Bandeira.
A estrutura fundiária de Almeirim foi mantida com grandes domínios territoriais, mantendo-se os anteriores e agora com outros que passarão também a integrar a classe dominante.

Os Grandes Proprietários de Almeirim, de antes do Liberalismo. História de Almeirim (17)

D. Pedro de Almeida - 32º Vice Rei da Índia
O relatório do Padre Gaspar Coelho da Silva de 1758, dá conta da afectação que sofreu o Paço e a Capela Real de Almeirim, em consequência do terramoto de 1755, que está comprovado que Almeirim, atingiu o grau 7 de acordo com moderna escala de Richter. O Paço foi afectado mas não ruiu, o que infelizmente aconteceu com a magnífica e imponente Capela Real.
Já narramos a última estadia do Rei D. José I e de sua Corte, no ano de 1767. Esta estadia marca o final da Vila Real e o início de um outro processo, com uma dinâmica já rural e mercantilista, que permite manter a população existente e uma curiosa história de diversas tentativas de vocação, que no decorrer dos cem anos subsequentes irão acontecer.
Comecemos por referir que desde D. Pedro II, passou a haver uma tendência para a constituição de grandes propriedades de alguns fidalgos e também das ordens religiosas, não apenas daquelas, que tinham conventos em Almeirim, mas também das que tinham sedes em Santarém.
O primeiro fidalgo a criar na zona um grande conjunto patrimonial e passar a ser o maior proprietário da região é o 3º Duque de Palmela, que deve ter recebido de dote real, toda essa enorme propriedade que estava sobranceira a toda a margem esquerda da Ribeira de Muge. D. Jaime, o 3º Duque de Palmela, casou com a Infanta ….filha do Rei D. Pedro II.
É ainda como resultado da simpatia de D. Pedro II por Almeirim e da sua presença frequente no Paço Real, que outro fidalgo de grande prestígio começa a adquirir património em Almeirim. Trata-se de D. Pedro de Almeida Portugal, que começa a adquirir muitos direitos patrimoniais, em particular o Casal do Vale de Nabais, que era património de S. João do Alporão. A esta propriedade vai acrescentando varias outras que lhes estavam anexas e aumentando assim todo um vasto património que viria a originar a Quinta da Alorna. D. Pedro de Almeida que foi um dos mais distintos militares e servidores do rei D. Pedro II e de seu filho, que lhe conferiu a sua ultima grande responsabilidade, através da sua nomeação como 32ª Vice Rei da Índia.
Outra grande casa fidalga que se instala em Almeirim, é a Casa dos Condes de Atalaia, que recebem em 1769 a mercê de gestão do Paço dos Negros, passando a deter todo um vasto território patrimonial, que acompanhava toda a margem direita da Ribeira de Muge e tinha sede em Benfica do Ribatejo, a Quinta de Santa Marta.
Em 1781 também os Duques de Palmela recebem vasto património, através de mercê da Rainha D. Maria I a favor de D. Alexandre de Sousa Hosltein e que poderá ser referenciado nos dias de hoje através da Quinta da Lagoalva, cujos domínios territoriais iriam desde a charneca da Parreira até ao Tejo nas proximidades de Alpiarça.
A família Câmara Coutinho, Senhores das Ilhas Desertas e da Ilha de Taipa, era entre todas as que detinham vasto património territorial, aquela que mais intimamente estava ligada à Vila, porquanto o seu Palácio estava situado nas proximidades do Paço Real e todo o seu património rústico se desenvolvia a partir dele, quer na direcção de Alpiarça, quer para Sul nas charnecas limítrofes da Coutada.
A esta referência aos detentores do património fundiário circundante à Coutada e à Vila, que representavam a classe dominante, deveremos acrescentar a Família Mota Cerveira, servidores de várias gerações como Monteiros Mor da Coutada, como Almoxarifes do Paço, como Oficiais de Justiça, sendo em consequência de todos esses serviços, a família merecedora de Brasão de Armas e aquela que teria mais raízes e ligações à Vila.
O ambiente social e económico, de Almeirim desde o Terramoto até á Revolução Liberal e Guerra Civil, é assim tipicamente de carácter feudal, em que estes grandes senhores feudais e também as Ordens Religiosas, garantem a fixação da população, através do relacionamento típico da enfiteuse, dos forais e por último do arrendamento.
Também nesta época, mais precisamente a partir de 1970, começam os aforamentos de terrenos nas imediações do terreiro do Paço, que irão constituir a abertura para a nova construção urbana da Vila.
A Feira Franca de S. Roque, que teria sempre lugar a 16 de Agosto, instituída por alvará do Rei D. João V em 1729, dá uma ideia clara da centralidade regional de Almeirim, nessa época, também como pólo de trocas e venda de excedentes da produção agrícola que era predominantemente de auto-consumo, mas onde estava generalizada a pastorícia e exploração das matas como produtoras de madeira e de matéria orgânica que servia de adubo das hortas e das restantes culturas.

Momento para uma Reflexão


Estes capítulos que tenho vindo a publicar, são modestos contributos pessoais, que têm como objectivo o reconhecimento público para o importante protagonismo que Almeirim teve, na História de Portugal.
Termina com os graves danos que afectaram o Paço Real, decorrentes do terramoto de 1755, uma fase crucial da evolução desta muito digna e importante Vila de Almeirim.
Almeirim deixará a partir de então, de ser sede do reino ou simplesmente habitação dos reis de Portugal.

Almeirim não foi apenas a “Sintra do Ribatejo ou de Inverno”, foi muito mais importante o seu protagonismo na História de Portugal e até do Mundo, do que esta tradicional adjectivação, que satisfez alguns dos seus cronologistas.

Almeirim foi durante cerca de 150 anos, praticamente toda a 2ª Dinastia, um dos principais centros de decisão da política mundial e principal sede da governação portuguesa e que durante essa época construiu um Império espalhado por todo o planeta.

Foi por ter perdido as suas referências patrimoniais, que o reconhecimento português para com Almeirim, ficou irremediavelmente esbatido.
Também se esbateu a memória do passado nos seus próprios habitantes.
Almeirim perdeu o seu carisma de outrora, porque não conseguiu manter visível qualquer referência ao seu passado heróico e glorioso.

Recuperar essas referências é assim um passo determinante, para a recuperação desse carisma, que tantas oportunidades novas, poderá originar e que reforçará certamente o orgulho próprio, de todos os almeirinenses.

Haverá muito poucas cidades de Portugal, que suplantem ou equiparem com Almeirim, no protagonismo da História de Portugal. Porém há muitas dessas cidades, que pelo património que mostram e divulgam, são importantes centros de estudos académicos e pólos de interesse turístico e cultural.

Construir uma “maquete” da Vila Real de Almeirim, seria uma obra com um enorme valor referencial.
Mas poderíamos ir um pouco mais longe…
As modernas tecnologias, em particular a informática abrem hoje a possibilidade de recriar todo esse património destruído e também as vivências dessas épocas.
É o que em todo o mundo civilizado se faz através dos chamados Centros Interpretativos da História.

Recriar Almeirim antiga, com os seus Paços e a sua Coutada, com a Ermida e a Pousada de S. Roque, com os Conventos da Serra e da Ordem Terceira de S. Francisco, com a sua Igreja quinhentista, com a Capela Real, a Horta e as Cavalariças, com os Palácios e com os seus bairros iniciais de servidores, é absolutamente possível e diria essencial.

Realizar este projecto, seria desde logo um enorme benefício, pois ele exigiria estudos rigorosos, mobilizando-se académicos, historiadores, recolhendo-se e classificando-se informação, que só por si já representaria uma enorme importação de dinâmica cultural e também de mobilização local.

Expor toda esta importantíssima referência em lugar público seria originar todo um vasto leque de reacções em cadeia, desde novas motivações empresariais para a terra, passando pelo mais importante que era a possibilidade de melhorar substancialmente a formação dos nossos filhos, a recuperação da memória colectiva e um substancial reforço na dinâmica turística.

Almeirim prosseguirá a sua história até aos dias de hoje, e muita coisa de importante para Portugal, continuará a ter nesta terra abençoada, a iniciativa de um protagonismo de elevadíssima importância e que infelizmente, é a parte da sua história magnífica, menos divulgada e valorizada.
Esta nova fase talvez seja porém mais atractiva, pois começarão a surgir como protagonistas alguns dos nossos antepassados e também muitas recordações de muitos, que ainda hoje felizmente, estão entre nós.
Continuaremos em próximos capítulos, a tentar no mesmo jeito de síntese, a transmitir esse conhecimento, que fui procurando adquirir, ao longo de vários anos de estudos, de conversas e de pesquisas, motivado pela paixão pela minha terra, pelo espaço onde fui educado e pelo ambiente, que contribuiu decididamente para a minha formação humana.

Mas impunha-se neste momento crucial da História de Almeirim, fazer uma pequena reflexão. Pois tudo isto só terá sentido se originar uma dinâmica de acção, que proporcione as condições para realização de um projecto, que vise recuperar Almeirim do caminho da vulgaridade e constitua motivação essencial para a recuperação do seu lugar de excelência e distinção.

A última estadia da Corte em Almeirim - História de Almeirim (16)



Carta das Montarias da vila de Santarém e da Coutada de Almeirim (1775)
O reinado de D. João V, não foi muito favorável às vivências no Paço de Almeirim.
Os novos hábitos sociais copiados da corte francesa, não eram agora muito compatíveis com a austeridade arquitectónica do Paço de Almeirim e também eram muito diferentes relativamente às tradições nacionais, que tinham tido forte expressão nesta Vila Real.
O Príncipe das Beiras D. José, futuro rei mantinha porém esses gostos antigos, pois era exímio cavaleiro e também aficionado à arte portuguesa da tauromaquia.
Por esse facto D. José frequentou Almeirim e também o Paço de Salvaterra.

O terramoto de 1755, foi dramático para a Vila Real.
O Paço sofreu danos importantes e a Capela Real acabou mesmo por ruir.

Os nobres que aqui tinham património logo reagiram e tentaram que o Rei D. José I, determinasse a recuperação dos edifícios afectados.
Foi uma longa acção de tentativa de influência na Corte, que acabou por ter o efeito do Rei decidir vir até Almeirim para verificar os estragos ou talvez com esta sua decisão tentar impor o seu desejo de recuperar o Paço real.

Não tendo o Paço condições para receber a visita real e sua comitiva foi um rico almeirinense, que disponibilizou a sua habitação para D. José se instalar.
D. Gastão da Câmara Coutinho, senhor das Ilhas desertas e da Taipa, era estanqueiro em toda a região (monopolista da distribuição de tabaco) e essa sua qualidade dava-lhe suficiente dinheiro para ter tido de imediato condições para recuperar a sua própria casa, também ela afectada pelo terramoto.
Como esse palacete recuperado serviria para instalar o Rei e sua comitiva, D. Gastão construiu de raiz uma casa para nessa altura de instalar a si próprio e a sua família.
Esta última habitação, é a casa onde hoje vivo e que meu trisavô comprou a um dos netos de D. Gastão, mantendo em traços gerais o aspecto exterior dessa época, ou seja 1765.
A casa onde D. José se instalou nesse ano de 1767, sofreu modificações exteriores de alguma monta e que lhe alteraram significativamente a sua traça, mas mantém, ao que sempre me foi dito, a mesma imponência que teria nessa época. É uma casa que também foi comprada pelo meu trisavô, a um dos netos de D.Gastão, que passou a ser a habitação de sua família e depois de herdada por um dos seus netos, Vasco Santo Andrade, veio a ter a remodelação já na década de 40 do século XX.

Esta estadia no ano de 1767, do Rei D. José, veio a ser a última estadia da corte, na Vila Real de Almeirim.
Por um lado a recuperação da baixa lisboeta foi a prioridade do Marquês do Pombal, por outro pelo facto dos estragos do Paço de Salvaterra terem sido menores, perante as limitações orçamentais, a recuperação do Paço de Almeirim, foi preterida.

Nessa época em que era almoxarife e primeiro responsável pela Coutada, João da Mota Cerveira, é nomeado Pedro Gualter da Fonseca como mestre-de-obras do Paço, o que ainda permite que alguns mantivessem a esperança da recuperação..
Porém, essas obras deixaram de ter verbas para a sua concretização.
Pouco tempo depois, talvez entre 1772 e 1774, é retirado do Paço de Almeirim, com destino ao Palácio de Sintra, o enorme fogão em mármore, que é uma impressionante obra do renascentismo.
Este acto, marca na prática o fim do Paço Real de Almeirim, como aposento dos reis de Portugal.

D. José antes de morrer, quis prestar uma homenagem à família servidora dos Mota Cerveira, ao fazer publicar no ano de 1777, a Carta de brasão de armas ao bacharel José da Mota Cerveira, cavaleiro fidalgo, filho do anterior almoxarife do Paço.
A família Mota Cerveira, ainda hoje tem vários descendentes directos como habitantes da cidade de Almeirim e deverá ser assim, talvez a mais antiga, das famílias tradicionais da terra.


da Vila Real à nobre Vila Rural - História de Almeirim (15)

D. Jaime o 3º Duque de Cadaval

As demonstrações de coragem do infante D. Pedro, futuro rei de Portugal, ao agarrar os toiros pelos cornos, vieram a ocasionar mudanças substanciais na forma de lidar toiros nos festejos tauromáquicos.
Nos limiares do século XVIII, passaram os cavaleiros nobres a tourear a cavalo, mas depois apeando-se rematavam essa lide matando os toiros a pé e de espada.
Esta era uma forma muito mais impressionante e emotiva de enfrentar o toiro e de lhe dar a morte. Esta emoção renovada, veio a ter como consequência uma popularidade acrescida das corridas de toiros.
Foi uma nova fase de rejuvenescimento da tauromaquia que viria a ter, mais uma vez, como palco dominante a Vila Real de Almeirim.

A grande personalidade do toureio equestre deste século é D. Jaime, o 3º Duque de Cadaval (1684-1749).
Os lugares onde ficam registadas para a história as suas maiores actuações são a Praça da Junqueira em Lisboa e a Praça de Madrid. Crónicas da época dizem que quando D. Jaime actuava, havia sempre Praça cheia e que a Junqueira teria uma lotação de mais de 12.000 pessoas.
D. Jaime é reconhecido também como um grande toureiro a cavalo e um grande estoqueador, por muitos cronistas espanhóis da época.
Ele toureou até às vésperas de sua morte.
Mas D. Jaime não foi apenas um toureiro, ele é a primeira referência portuguesa a criar toiros de lide através de uma selecção apurada. Ou seja, ele é o primeiro dos ganadeiros a seleccionar com critério, visando a nova forma de tourear.
Esta sua ganadaria é instalada em Almeirim, nas charnecas da Ribeira da Muja (Muje), muito provavelmente a partir de vacas, que pastavam de forma selvagem na coutada real e nos limítrofes.
O facto de D. Jaime se instalar em Almeirim deve estar realcionado com o facto de ter sido casado com D. Luísa de Portugal, filha do Rei D. Pedro II.
D. Luísa casou em primeiras núpcias com D. Luís Ambrósio de Melo, o 2º Duque de Cadaval e irmão de D. Jaime, que morreu muito novo. Porém é muito natural de que todo o património da Casa Cadaval tenha sido oferecido de dote pelo Rei neste primeiro casamento, sendo portanto consistente a hipótese de todo esse vasto património ter sido um destacamento das montarias vizinhas à Coutada Real de Almeirim.
Ao instalar-se nas imediações de Almeirim, D. Jaime centraliza para as proximidades toda uma apetência de outros nobres e Lavradores, que também quiseram iniciar-se na criação de toiros bravos. Outra ganadaria referenciada na mesma época é a de Rafael José da Cunha, que deveria estar sedeada também nos limites da coutada de Almeirim, entre Alpiarça e a Chamusca.
Mais tarde muitos outros nobres, irão adquirir na jurisdição de Almeirim terras, para instalarem nelas as suas ganadarias.

Não se pode afirmar com muita consistência que esta nova procura de terras para instalar ganadarias, tinha um objectivo de actividade económica, pois os toiros não eram ainda nessa época vendidos e a sua carne era normalmente oferecida, para Instituições de caridade. Mas contribuíram para manter algum emprego e atraíam visitantes aos festejos tauromáquicos e por esse facto incrementaram o comércio. Por outro lado esta nova forma de criar animais, veio sim motivar a criação de gado bovino para venda no mercado, para trabalhos de tracção e de transporte.

Almeirim foi assim o centro onde se instalaram as primeiras ganadarias portuguesas e também passou a ser um importante centro de treinos dos grandes cavaleiros toureiros e onde se realizavam muitos e importantes espectáculos tauromáquicos.
Passou também a ser um importante centro de criação de bovinos para a tauromaquia, para o trabalho e para o transporte.

A nova vocação do Paço de Almeirim – História de Almeirim (14)

Durante o período “Filipino” os nobres que em Almeirim possuíam terras e casas, pela motivação de aqui ser local de frequência da Corte, deixaram de as frequentar e cederam direitos a rendeiros ou atribuíram forais a servidores.
Degradou-se assim muito património local, por ausência de motivação para a manutenção, mas garantiu-se um mínimo de vivência social.

Foi D. Pedro II, quem voltou a frequentar o Paço Real.
Ainda como Infante e proprietário de toda a “Casa do Infantado” por mercê de seu pai que a fundou através dos bens confiscados aos nobres que foram considerados traidores por terem estado ao serviço dos Filipes.
Este Infante teve uma presença assídua no Paço de Almeirim, mas também no de Salvaterra, motivado pela sua paixão, que eram mais uma vez as Corridas de Toiros e as lides tauromáquicas.
D. Pedro, filho de D. João IV, desde muito jovem que foi um grande entusiasta das lides tauromáquicas, tendo sido toureiro a cavalo e também considerado o primeiro português a pegar os toiros pelos cornos, ou seja iniciador da tradição genuinamente nacional, do Pegador de Toiros ou Forcado, como muito mais tarde se passou a chamar.
Foi D. Pedro II, que mandou transladar o corpo do Cardeal de Almeirim, para os Jerónimos em Lisboa.
Foi ainda D. Pedro II, que através de carta aos moradores de Almeirim, dá o primeiro sinal de emancipação relativamente à propriedade real, ou seja dá a abertura para a sociabilização e dinamização económica da vila, que irá permitir a sua evolução.
Esta emancipação foi feita de acordo com algumas garantias, nomeadamente ao nível da permanência temporal e de alguns serviços, os habitantes e servidores do paço, poderiam passar a beneficiar de direitos de propriedade hereditários, na propriedade real.
Era assim, o início da possibilidade de estabelecimento em Almeirim e simultaneamente de aumento do número de seus habitantes.
Enfim de uma nova e moderna motivação para o seu crescimento, preservação e evolução.

D. Pedro II é assim o primeiro responsável pela nova imagem de Almeirim.
É a imagem que mais vulgarmente é passada…
Almeirim a “Sintra de Inverno”, onde a Casa Real passava algumas temporadas de descanso e recreio.
Infelizmente esta é a imagem mais divulgada, mais fútil e menos apreciada, que menospreza o importante protagonismo histórico e cultural de Almeirim, durante toda a dinastia de Avis.

Foi porém muito importante para Almeirim que os reis voltassem a aqui estabelecer-se e motivou muitos dos habitantes locais a aqui permanecerem.
Tudo isto é evidenciado na primeira e segunda década do século XVIII, através autorização de D. João V, de pagar a instalação de um médico e um boticário na Vila e pela instituição da feira franca de S. Roque.
Também nomeia Arquitecto e disponibiliza verbas para obras no Paço, dando assim a indicação a sua família e aos seus descendentes da vontade de continuar a manter esta nova vocação de Almeirim, ser local de estância da família real.

Apoio aos "Conjurados" - História de Almeirim (13)

Portugal estava empobrecido após 60 anos da governação Filipina.
Perdêramos muitas das possessões ultramarinas e o controle das rotas marítimas.
Os Holandeses e os Piratas, beneficiavam agora da nossa incapacidade de gestão.
As promessas de Filipe I, de dar tensas a muitos fidalgos e de nunca colocar estrangeiros na governação de Portugal, já há muito que não eram cumpridas.
A castelhana Duqueza de Mantua, era a Vice Rainha de Portugal.
Os descendentes e herdeiros da nobreza, que havia sido subornada, estavam agora revoltados e os sentimentos nacionalistas tinham voltado aos seus espíritos.
Chamaram-lhes “os Conjurados” a esse grupo de nobres, cujos antepassados não quiseram sentir o “Espírito de Almeirim”, mas que agora se determinavam a seguir a vontade do povo.
Durante dois anos tentaram em vão mobilizar a vontade do Duque de Bragança e herdeiro legítimo de Dona Catarina, para assumir a responsabilidade de uma revolta.
D. João era um dos mais ricos homens de toda a península e também um dos mais influentes. Bastará referir que tinha um exército pessoal de cerca de 13.000 homens.
Mas D. João era também um homem sensato e não embarcou em aventuras precipitadas. Chegaram os Conjurados a propor uma Republica de Nobres e também que D. Duarte de Bragança, o Marquês de Trevilha, tio de D. João, aceitasse a liderança da revolução.
A oportunidade surgiu quando Filipe IV se viu envolvido entre duas frentes de guerra, no sentido territorial oposto ao de Portugal.
Foi o seu envolvimento na guerra dos Trinta anos e sobretudo a Revolta da Catalunha, que exigiu uma enorme mobilização, para os quais também foram recrutados muitos portugueses.
Foi então que D. João, Duque de Bragança, que vivia em Vila Viçosa, deu o seu aval ao movimento. Aquele era o momento da oportunidade.
Na manhã de 1 de Dezembro de 1640, os Conjurados invadem o Paço de Lisboa e declaram a independência de Portugal e D. João como seu Rei.
Almeirim, jubilou com o conhecimento do facto e foi das primeiras Vilas a aderir ao movimento.
Em Janeiro de 1641, reúnem-se Cortes em Lisboa e D. João IV é formalmente aclamado Rei de Portugal.
Seguir-se-á a guerra da Restauração, com muitas escaramuças fronteiriças e a batalha do Montijo (Badajoz) em que tivemos uma vitória redutora.
O facto de D. João IV ser um homem muito poderoso e de ter um exército próprio, foi determinante para a nossa independência, pois em Portugal nessa época tudo faltava, nem sequer cavalos tínhamos, pois tinham sido exterminadas muitas coudelarias.
Quando salientamos o “espírito de Almeirim” é porque nessa época foi efectivamente necessário encontrar toda uma vontade colectiva, que tinha na sua base o sentimento patriótico, para conseguir vencer todas as inúmeras adversidades e manter a revolução vitoriosa.
Foi feito na época o lançamento da “dizima”, um imposto que obrigava a todos pagar 10% dos seus rendimentos para a salvação da pátria e não há nenhum indicador histórico, de que esse imposto tenha provocado qualquer mal estar.

Em 1643 D. João IV está em Almeirim, pois são registadas ementas reais de banquetes no Paço Real.
Almeirim tinha sabido manter o seu nobre estatuto de Vila Real de Portugal.

O reconhecimento espanhol da independência nacional, só veio a ser formalizado pelo tratado de Lisboa em 1668 e assinado pelo Rei de Espanha Carlos II e pelo Rei de Portugal, D. Afonso VI.
Entretanto o reinado de D. João IV, fora uma sequência heróica de inúmeras conquistas, na recuperação dos territórios portugueses de além-mar, que nos iriam permitir manter a nossa independência.