A nova vocação da Vila Real - História de Almeirim (23)


Não deixa de ser interessante a verificação de quem são os destinatários da obra das “Viagens na Minha Terra” de Almeida Garret. São eles, Passos Manuel , Manuel Nunes Freire da Rocha ( Barão de Almeirim) e D. Gastão da Câmara Coutinho Pereira de Sande (Conde da Taipa).
Todos eles com fortes ligações a Almeirim.
Pelo casamento, como foi o caso de Passos Manuel, pois sua mulher era da família Sousa Falcão de Alpiarça, tendo vivido após a sua retirada da política na Quinta da Torre em Alpiarça. Pelas responsabilidades administrativas e políticas na Vila Real e título de Barão de Almeirim, o natural do Pombalinho, Manuel Nunes Freire da Rocha. Por ser um filho da terra e seu grande benfeitor, a mais prestigiada figura nobre almeirinense, o Conde da Taipa.
Poder-se-á pensar tratar-se apenas de uma cortesia de amizade de Almeida Garret, mas penso que essa seria uma análise simplista, pois para além dela, estará também a percepção que durante a sua estadia de que Almeirim assumia efectivamente, ainda nessa época, uma centralidade social e económica, dominante em todo o Ribatejo.
Corrobora neste sentido a notícia que pode ser lida na “Cronologia de Almeirim” do Prof. Jorge Custódio. Aí se dá nota que em 1835, “os homens bons de Almeirim organizam-se para facilitar a venda dos bens nacionalizados às Ordens Religiosas”.
Efectivamente assim foi. Os grandes senhores que já possuíam bens em Almeirim organizaram-se para adquirir as propriedades nacionalizadas e reforçaram substancialmente os seus domínios patrimoniais. Por isso o liberalismo não originou directamente a divisão da propriedade e muito pelo contrário originou a sua concentração. Porém essas propriedades passavam agora a ser grandes explorações agrícolas, geridas por grandes Lavradores, muitos deles descendentes de antigos nobres, outros da nova nobreza e outros ainda simplesmente homens de negócios, que no advento da produção empresarial agrícola pretendiam investir o seu dinheiro na actividade económica dominante.
Destas grandes Casas Agrícolas que então se formaram no Concelho de Almeirim e que lideraram todo o processo da modernização agrícola nacional, ainda hoje existem imponentes referências, que apesar das divisões a que foram sujeitas, por partilhas ou por destaques para venda, dão-nos uma ideia precisa da imponência que deveriam ter naquela época: A Casa Cadaval em Muge; A Quinta de Santa Marta em Benfica; o Casal Branco do Conde de Sobral de que foi destacado o Convento da Serra e o Casal Monteiro; o Mouchão do Alfange na Tapada; a Padilha em Almeirim; a Alorna; a Goucha e Goucharia e os domínios dos Mascarenhas que incluía um vasto património anexo à actual Calha do Grou; a Quinta da Torre que fazia parte de uma enorme propriedade da família Sousa Falcão; a Lagoalva e os seus anexos do Duque de Palmela…
Nessa época estas grandes Casas Agrícolas, detinham em Portugal as maiores produtividades quer na produção de cereais, quer na produção pecuária. Também foi nas várzeas da Ribeira de Muge que se iniciou a moderna cultura de arroz, através da iniciativa de José António Pinhão que se instalou na zona da Raposa, a partir do ano de 1830. Foi também nessa época que a Coudelaria do Casal Branco se distinguia em todo o país pela qualidade dos seus cavalos. Ela tinha sido fundada pelo Barão de Sobral e foi atingindo o auge do seu prestígio, pela acção e dedicação do 3º Conde de Sobral, D. Hermano Sobral de Melo Breyner.
É muito interessante a verificação dos fenómenos que acontecem em Almeirim, em que a agricultura como actividade económica, era quase exclusivamente determinada pela grande exploração agrícola e se vai transformar, num curto espaço de tempo, numa terra de emigrantes e onde vai ser dominante uma nova classe de agricultores de pequena dimensão, os Fazendeiros de Almeirim.
Este interessantíssimo processo de evolução, tem a sua primeira origem na venda da Quinta da Alorna em 1843, a José Dias Leite Sampaio e que recebera o título de Barão da Junqueira.
O Barão da Junqueira, que era um banqueiro e um muito abastado homem de negócios, irá tudo revolucionar com os seus investimentos. Ele planta um enorme olival e constrói o primeiro Lagar de Azeite movido a vapor.
Mas a sua obra mais importante foi as diversas plantações de vinha e a adega para fabrico dos vinhos.
O êxito produtivo das vinhas do Junqueira, plantadas no campo (aluvião), foi de tal forma grande pela produtividade que a casta escolhida tinha, que essa casta histórica, o Fernão Pires irá ser a paixão abençoada de todos os outros proprietários e até dos trabalhadores rurais, que começavam a chegar para os trabalhos das vinhas.
Todos quiseram também plantar vinhas no campo. Todos quiseram adquirir terras no campo.
Criou-se uma verdadeira euforia. Almeirim tinha encontrado finalmente a sua vocação que irá tudo mudar.
A Vila Real irá agora caminhar para a Vila Vitivinicola e irão vir muitos emigrantes, ou seja os antepassados da maior dos almeirinenses dos nossos dias.
Mas nem tudo irão ser rosas e uma praga irá originar actos heróicos de resistência, uma luta de sacrifícios e uma autêntica revolução social.